Joana Canas Varanda, de 39 anos, era mãe, advogada e lutava contra o cancro. Morreu esta segunda-feira, 27 de março. Deixou um filho de apenas seis meses e algumas publicações no Facebook onde lamentava a situação que teve de passar. Apesar da sua doença oncológica, via-se forçada a trabalhar todos os dias, visto que não beneficiou de qualquer apoio por parte do Estado ou através da Caixa da Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS).

O diagnóstico para o “cancro em último estádio” chegou em 2022, e desde então que realizava tratamentos regularmente. Joana continuou sempre a trabalhar, mesmo durante estes momentos mais vulneráveis e, para mostrar a sua realidade, fotografava-se no dia a dia. Estas imagens eram muitas vezes acompanhadas por queixas de falta de empatia e indiferença por parte de alguns juízes que rejeitavam os requerimentos para adiar diligências, argumentando que a advogada podia ser substituída por uma colega.

No Facebook contava outros episódios que iam acontecendo na sua carreira. “Após ter sido convidada a informar o processo sobre se iria ou não falecer, em cinco dias, foi o cliente igualmente notificado para informar se gostava ou não de mim, também em cinco dias. Com tristeza comuniquei que atiro a toalha ao chão porque a miserável doença que me assola aos 38 anos nem me deixa escrever em condições. O cliente, compreensivelmente, constituiu novo mandatário”, escreveu. “A Sra. Dra. Juiz, por sua vez, enquanto limava as unhas, adiou o julgamento de ontem [3 de novembro de 2022] para dezembro e deseja-me cumprimentos”.

Após a notícia da sua morte, foram várias as reações nas redes sociais. Fernanda de Almeida Pinheiro, que enquanto candidata a bastonária propôs a realização de um referendo sobre o carácter exclusivo do CPAS, afirma que a morte de Joana é lamentável. Descreveu-a como uma mãe que morreu “sem qualquer apoio institucional e do Estado e sem que a Justiça pudesse parar para a conseguir ajudar.”

Fernanda de Almeida Pinheiro acrescenta que o ramo da advocacia está a passar por uma “realidade medieval”. “É ao Estado que compete fazer cumprir a Constituição e não pode continuar a fazer de conta que nada tem que ver com o que se passa com cerca de 40 mil profissional que são seres humanos como os demais e que escolheram as profissões legais para servir a Justiça. Manter esta situação é denegar a cada um deles os seus direitos constitucionais de previdência mais básicos”, escreveu no Facebook. “Passaram quase 10 anos desta luta e isto vai mesmo ter de mudar, porque não vamos deixar que isto possa continuar a ser uma realidade medieval”.

Victor Alves Coelho, o presidente da Direção da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, já se manifestou sobre o tema. Em entrevista ao “Jornal de Notícias”, apresentou as suas condolências “pela trágica ocorrência de forma especial à sua família”, dizendo também que “por respeito à memória da Dra. Joana Canas Varandas e ao luto da família, não devia, nesta fase, acrescentar o que quer que seja.”

Mesmo assim, adiantou que a advogada “tinha conhecimento efetivo” de todos os “apoios e subsídios” da CPAS. “Perante os pressupostos falsos e as considerações incorretas propaladas nas redes sociais”, Victor aponta que a Caixa de Previdência dá aos seus beneficiários um conjunto de apoios e subsídios.

Esta não é a primeira vez que um advogado não tem acesso aos seus direitos legais. Em novembro de 2022, por exemplo, a Ordem dos Advogados trouxe a público o caso de uma advogada que foi obrigada por um juiz de Aveiro a comparecer no tribunal nove dias depois de ter sido mãe. Apesar de ter pedido um adiamento, disseram-lhe que o podia fazer-se substituir por um colega. Para a OA, agiu “sem a menor empatia e compaixão humana”, acrescentando que foi “uma clara violação da lei e das prerrogativas dos advogados e um atentados aos direitos fundamentais de igualda e não discriminação em função da maternidade.”



segue fonte da notícia: https://www.nit.pt/fit/saude/joana-tinha-cancro-mas-nao-teve-direito-apoios-ou-baixa-morreu-aos-39-anos